O surto de legionella que atingiu o concelho de Vila Franca de Xira matou onze pessoas mas aqueles que ficaram infectados e internados, incluindo os seus familiares, vão sofrer consequências emocionais para a vida se não forem acompanhados. A maioria viveu situações de stress agudo grave que não vão desaparecer de um dia para o outro. O alerta é lançado por Mónica Batalha, psicóloga responsável do serviço de psicologia da Junta de Freguesia da Póvoa de Santa Iria, que está a acompanhar algumas vítimas do surto.
Dor e ansiedade generalizada, insónias, pesadelos, angústia, inabilidade em lidar com a sociedade, medo de sair à rua e apanhar frio e até medo de voltar a contactar com hospitais são algumas das consequências mais comuns num surto como este. “No futuro, como a legionella deixa algumas lacunas e marcas físicas, as pessoas têm tendência a regredir e a sentir novamente emoções de quando foram internadas, mesmo que só tenham uma constipação”, avisa Mónica Batalha.
Para a psicóloga, quanto mais cedo as vítimas procurarem apoio, mais fácil se torna o tratamento. “As pessoas mais vulneráveis emocionalmente a estes cenários de crise são os idosos e as pessoas com pouco apoio familiar, em que os recursos da comunidade não são tão acessíveis e onde as pessoas estão mais isoladas”, explica. O tratamento passa por, recorrendo aos recursos pessoais da vítima e às suas capacidades de resiliência, encontrar e gerir estratégias para lidar com a situação traumática, devolvendo o funcionamento cognitivo e psicológico que a pessoa tinha antes do surto acontecer.
O acompanhamento do luto é o mais difícil. “Quanto antes conseguirmos lidar com a pessoa enlutada melhor. Nestes casos há um tampão emocional, a pessoa não fala, não quer ouvir falar do falecido. O que acontece é um acumular de emoções negativas e é muito importante a pessoa desabafar, falar da situação traumatizante e receber um acolhimento activo, de escuta activa, para que as coisas comecem a ficar reorganizadas no processo cognitivo da pessoa enlutada”, explica. O tratamento psicológico destas situações depende muito do utente e tanto pode demorar de um mínimo de quatro sessões até vários meses. Mónica Batalha acredita que com o passar do tempo é provável que mais pessoas venham a solicitar o apoio psicológico, alguns até por recomendação dos médicos de família.
O apoio é gratuito e basta apenas formalizar uma inscrição por escrito na sede da junta de freguesia. A Junta de Freguesia da Póvoa de Santa Iria presta apoio psicológico às vítimas do surto de legionella através do serviço de psicologia que já funciona desde 2005. O serviço nasceu de uma proposta feita por Mónica Batalha à junta de freguesia e hoje em dia acompanha pessoas de vários estratos sociais. Mónica é natural da Póvoa, cidade onde cresceu e viveu. Além de Mónica Batalha o serviço conta também com a colaboração de Cátia Cerqueira.
As responsáveis garantem que o preconceito associado à psicologia está a diminuir e que hoje esse apoio é visto como tão fundamental como qualquer outro da medicina moderna. “Não temos sentido vergonha por parte da população, apenas nos idosos notamos um pouco mais de relutância”, notam.
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